Nós,
participantes do 13º Fórum Internacional Software Livre, realizado em
Porto Alegre entre 25 e 28 de julho de 2012, tomamos a liberdade de
escrever esta carta pública endereçada a Excelentíssima Presidenta da
República Dilma Rousseff, em nome da comunidade software livre
brasileira, com o objetivo de manifestar nossa posição diante das
políticas públicas na área de tecnologia da informação e internet
implementadas por vosso governo.
Não
poderíamos deixar de relembrar aqui a histórica visita que Vossa
Excelência, e o então Presidente Lula, fizeram a este mesmo fórum, em
sua décima edição, em 2009. Esta visita, que muito nos orgulhou, foi uma
verdadeira celebração das liberdades digitais, e um reconhecimento dos
esforços
da comunidade software livre internacional, e, especialmente
brasileira, na luta pela manutenção do conhecimento como bem comum. Os
avanços e conquistas invejáveis produzidos pelas políticas públicas do
governo federal do Brasil em direção às liberdades e à soberania
tecnológicas foram reconhecidos e reafirmado o compromisso com esses
valores.
Além
do encontro do então Presidente Lula com os principais expoentes da
comunidade software livre internacional, o momento foi marcado por seu
discurso memorável, no qual o Presidente afirmou que em seu governo era
“proibido proibir”, que “Lei Azeredo é censura”, além de determinar
publicamente ao então Ministro da Justiça, Tarso Genro, a construção de
um marco civil da internet.
Na
oportunidade, Lula também reafirmou a defesa do software livre no seu
governo, e foi ovacionado pelo público presente ao afirmar, em nome de
todos os brasileiros:
"Nós tínhamos que escolher: ou nós iríamos para a cozinha preparar o
prato que a gente queria comer, com os temperos que nós queríamos
colocar e dar um gosto brasileiro para a comida, ou nós iríamos comer o
prato que a Microsoft preparou para a gente. E, graças a Deus,
prevaleceu, no nosso país, a questão e a decisão pelo software livre".
Além
do compromisso assumido e cumprido durante o Governo Lula, e reafirmado
pelo então Presidente durante o fisl10, em 19 de janeiro de 2010, no
primeiro mês do vosso governo, foi publicada
a Instrução Normativa nº 1, que dispôs sobre os critérios de
sustentabilidade ambiental na aquisição de bens, contratação de serviços
ou obras pela Administração Pública Federal. Dentre as diretrizes,
destacam-se as determinações que proíbem o uso de componentes,
ferramentas, códigos fontes e utilitários proprietários, e também a
dependência de um único fornecedor, dando preferência ao uso de software
livre - mais uma mostra de que o governo federal tinha ciência dos
benefícios do tratamento dos bens imateriais como bens de domínio
público, e da importância da manutenção do livre acesso ao conhecimento e
seu compartilhamento como ferramenta de incentivo à democracia.
No entanto, hoje algumas questões pontuais têm deixado a todos nós, militantes do software e do conhecimento livre, apreensivos:
-
A
retirada da licença livre Creative Commons do site do Ministério da
Cultura e sua mudança de posicionamento em relação à reforma dos
direitos autorais e às liberdades civis na internet;
-
A
introdução, no acordo do Ministério das Comunicações com as Teles em
relação ao plano nacional de banda larga (PNBL), de um grave precedente
de limitação e tarifação do volume de dados que trafegam pela conexões
das operadoras - como uma espécie de pedágio ou taxímetro cobrado por
conteúdos de terceiros;
-
A
iniciativa no INPI - Instituto Nacional de Propriedade Industrial - de
abrir uma consulta pública indicando o patenteamento do software no
Brasil, na contramão de uma das maiores lutas do movimento software
livre internacional;
-
O Pregão Eletrônico (N. 116/7066-2012 – GILOG/BR) da Caixa Econômica Federal, na ordem de 112 milhões de reais, que
contraria um histórico de investimento em desenvolvimento e adoção de
softwares livres produzidos especificamente para a instituição.
Algumas
décadas depois de os softwares e a internet terem se tornado elementos
indissociáveis de nossas rotinas, já podemos afirmar com sólidos
argumentos econômicos, científicos e sociais que:
-
o incentivo e a manutenção da luta pelo Software Livre,
-
a ausência de patentes de software, e a proteção da criação dos mesmos pela lei dos direitos autorais,
-
a manutenção de uma internet livre, neutra e inimputável,
são
estratégias não só viáveis como indispensáveis para o despontar do
Brasil como um país internacionalmente competitivo no que diz
respeito à manutenção da inovação tecnológica, bem como para a
manutenção das estratégias de democratização do conhecimento através da
Inclusão Digital.
Por
fim, confiantes de que podemos restabelecer a interlocução do governo
federal com a comunidade software livre, da cultura digital e ativistas
por direitos civis na internet, pedimos, publicamente, uma audiência de
nossos representantes com Vossa Excelência para que possamos retomar o
diálogo construtivo que sempre tivemos com o governo federal nestes
últimos anos.
Aproveitamos
também para manifestar nosso apoio e parabenizá-la pela condução da
política econômica, dos programas sociais, em especial de combate à fome
e à pobreza, e na firme postura contra a corrupção em nosso país.
Sem mais, subscrevemo-nos.
Ricardo Fritsch
Coordenador geral da Associação Software Livre.org, em nome dos participantes do 13º Fórum Internacional Software Livre